A menopausa muitas vezes é descrita como uma maratona invisível. Não importa o quanto se durma, o corpo parece carregar um peso extra. Mas existe algo além da fadiga física: um cansaço sensorial profundo, em que luzes, sons e até toques cotidianos tornam-se excessivos. Esse estado é conhecido como fadiga sensorial — e, na menopausa, ele se intensifica até criar o que chamo de colapso sensorial.
Não se trata de “preguiça”, nem de fragilidade. É fisiologia. O estrogênio, que regula neurotransmissores como serotonina e dopamina, cai bruscamente, tornando o cérebro mais vulnerável à sobrecarga. Some a isso sono fragmentado, ondas de calor, alterações cognitivas e metabólicas, e o resultado é simples: não há desejo, nem prazer, nem libido que resistam. Com apenas um ou dois sintomas intensos, já é suficiente para se sentir esgotada.
Esse corpo não está quebrado. Ele está se protegendo. O sistema nervoso reduz a resposta para preservar energia, como uma defesa. O cérebro precisa de repouso para continuar funcionando — assim como na adolescência, quando o corpo em transformação exige descanso para crescer.
Na intimidade, isso se traduz de forma clara. Uma carícia que deveria relaxar pode parecer exigência. O corpo, saturado, classifica o toque como “mais um estímulo a administrar”. Essa indiferença não é desamor: é proteção. Quando os receptores estão sobrecarregados, o sistema fecha as portas para garantir segurança.
É aí que entra o valor das pausas. Pausar na intimidade não é recusar o outro: é criar espaço para observar os próprios limites e fronteiras. É nesse intervalo que você pode sentir se está bem com aquela ação, se quer continuar naquele caminho ou se precisa redirecionar. Pausar traz segurança, ativa os captores de prazer e abre espaço para sensações mais refinadas. Quanto mais lento o gesto, mais os receptores de prazer se abrem. O corpo encontra um estado paradoxal e delicioso: relaxamento e excitação ao mesmo tempo.
Práticas neuroprotetivas já são usadas há décadas em contextos de trauma e regulação do sistema nervoso (Peter Levine, Bessel van der Kolk, entre outros). O que desenvolvi foi adaptar essas ferramentas ao campo da intimidade, criando um método estruturado para tornar o prazer possível mesmo em meio à sobrecarga.
E isso tem efeitos concretos. Uma intimidade saudável durante a menopausa não é apenas prazer pelo prazer. Ela devolve energia, reforça vínculos, regula o sistema nervoso, aumenta vitalidade e ajuda o corpo a sustentar os contrastes da vida. Porque no mesmo dia em que recebemos uma boa notícia, podemos também viver uma dor. O sistema humano é feito para lidar com esses polos, mas precisa de apoio, de pausas e de direção.
A escolha é sempre sua: onde colocar o foco. Naquilo que pesa ou naquilo que expande? O corpo em transformação pede novos gestos, novos mapas, novas formas de pensar. Pausar é o caminho para enxergar esses novos percursos.
Novo corpo. Novas rotas. Novos pensamentos.
Um upgrade para os próximos 50 anos.
Referências citadas:
Peter Levine, Waking the Tiger (1997) — trauma e proteção neurológica.
Bessel van der Kolk, O Corpo Guarda as Marcas (2014) — corpo, prazer e regulação.
Pat Ogden, Sensorimotor Psychotherapy (2006) — percepção corporal e bloqueios emocionais.
Lisa Mosconi, The Menopause Brain (2024) — cérebro feminino, hormônios e neuroplasticidade.
Kelly Casperson, It’s Not Your Libido (2024) — desejo e neurociência da intimidade na menopausa
Especialista em neuroplasticidade aplicada ao corpo feminino, com mais de uma década de estudo e prática clínica, Cristiana criou uma abordagem que integra saúde hormonal, escuta somática e vitalidade sensorial.
Especialista em neuroplasticidade aplicada ao corpo feminino, com mais de uma década de estudo e prática clínica, Cristiana criou uma abordagem que integra saúde hormonal, escuta somática e vitalidade sensorial.